A justiça restaurativa é uma prática e proposta de justiça que se distancia da ideologia e da engrenagem do sistema penal tradicional. Ela busca, por meio de um ideal reconciliatório, conceber e resolver os conflitos em questão de modo distinto do punitivismo clássico do sistema penal. Mais do que um mecanismo específico, trata-se de uma teoria, propriamente – o que torna a sua apropriação pelo sistema de justiça muitas vezes problemática.
Em primeiro lugar, a justiça restaurativa recupera a centralidade do papel da vítima durante o seu processo – no sistema penal tradicional, o papel da vítima é secundarizado e é a sociedade como um todo que é vista como tendo sido lesada. Essa recuperação não é só no plano abstrato: a partir da concordância de todas as partes, a vítima é colocada frente a frente com quem a agrediu, permitindo que ela expresse os danos e sofrimentos causados pela agressão. Isso possibilita que a pessoa causadora do dano compreenda os impactos da sua ação e expresse as condições particulares em que ela estava. Dessa forma, cria-se também um espaço propício para que os danos possam ser restaurados.
Em alguns países, a justiça restaurativa é utilizada paralelamente ao sistema penal tradicional: há um entendimento dos benefícios psicológicos trazidos pela sua proposta, ainda que a resposta principal continue sendo a do sistema penal tradicional. Historicamente, a justiça restaurativa foi utilizada emblematicamente no processo de restauração política na África do Sul, pós-apartheid. No processo, réus e vítimas ficaram frente a frente, a fim de que policiais, por exemplo, pudessem reconhecer os danos e as dores infligidas às vítimas. Nesse caso, jogos e esportes também foram utilizados no processo. Na Austrália, a justiça restaurativa tem origem e adquire importância principalmente a partir da percepção da quantidade considerável de pessoas indígenas capturadas pelo sistema penal tradicional e pelo reconhecimento de que esse sistema não era pertinente a essa população, que pertence à outra realidade social.
A diferença cultural e o respeito pela diversidade tornam a justiça restaurativa uma prática a ser considerada, uma vez que ela não só abre mão da busca por uma pena – muitas vezes baseada no sofrimento –, mas se propõe, principalmente, a observar as causas e contextos dos conflitos e agressões. Recuperando as relações entre indivíduos ou repensando o ordenamento jurídico tradicional, o conflito pode ser resolvido sem punição – a partir do entendimento e do reconhecimento entre as partes e a formação de uma possível restauração dos danos causados.
Em novembro de 2015, o ITTC organizou a Reunião de Trabalho sobre as Alternativas Penais, onde o espaço da Justiça Restaurativa foi discutida no sentido de questionar se ela deve ou não ser considerada uma alternativa penal. Para algumas pessoas, o fato de ela estar no escopo da política de alternativas pode ser um sinalizador de um novo paradigma de justiça no tratamento de conflitos no âmbito penal. Por outro lado, há quem a entenda como um rompimento do paradigma punitivo atual.
fonte: http://ittc.org.br/ittc-explica-justica-restaurativa/